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Quem tomou mix de vacinas não consegue emitir certificado para viajar

Quem tomou mix de vacinas não consegue emitir certificado para viajar

Apesar da alta eficácia do mix vacinas para proteger contra a covid-19, segundo estudos, a intercambialidade tem gerado entraves para a emissão do certificado de vacinação em três línguas pelo ConecteSUS. Quem tomou a primeira dose de AstraZeneca e a segunda de Pfizer não consegue gerar o documento, exigido em países como os da Europa para comprovar a vacinação, apesar de os imunizantes constarem no sistema federal.

O professor de teatro Weslley Fontenele, de 28 anos, conta que a primeira dose de AstraZeneca apareceu no sistema logo que foi aplicada, em junho. Na hora de receber a segunda, a surpresa: a dose foi registrada como Coronavac, combinação que não é permitida, em vez de Pfizer. A cidade do Rio, onde mora, autorizou que as pessoas que tomaram a vacina da Fiocruz pudessem completar o ciclo com a Pfizer em caso de falta do primeiro imunizante.

Para resolver o erro, bastou retornar ao posto de saúde que um profissional corrigiu a informação no sistema. Contudo, ele enfrenta outro problema: a emissão do certificado de vacinação completa. A falta do documento ameaça a viagem de estudos para a França em 2022, onde faz doutorado em Artes pela Universidade de Montpellier 3 e também pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).

“Irei ao exterior em junho ou em julho, dependendo das condições sanitárias, e posso vir a ter problema porque o ConecteSUS não gera o passaporte para quem tomou doses diferentes”, lamenta.

O caso expõe as complicações de quem precisa viajar e não consegue comprovar a imunização justamente por ter tomado um mix de vacinas, medida que também foi autorizada pela Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo diante da falta de AstraZeneca para a segunda dose.

“O passaporte da vacina, por si só, é um tópico muito controverso. É uma mistura de questões sanitárias e éticas, tanto é que já teve judicialização em alguns estados. Ele pode fazer sentido do ponto de vista sanitário, mas não sem a conscientização da população (sobre medidas preventivas)”, analisa o professor de epidemiologia e vice-coordenador da Sala de Situação da Universidade de Brasília (UnB), Mauro Sanchez.

Caso francês

No caso da França, a regra atual é que pessoas vindas do Brasil totalmente imunizadas com Pfizer, Moderna (que ainda não está disponível no país, mas é aceita lá), AstraZeneca ou Janssen podem entrar no território apenas com o certificado de vacinação e com uma declaração de ausência de sintomas e de contato com caso positivo de covid-19.

A regra muda para os parcialmente ou não vacinados, que devem apresentar, além da declaração, motivo de força maior que justifique a viagem à França, exame negativo de RT-PCR ou de antígeno feito em até 48 horas antes e outra declaração em que garante realizar teste de antígeno na chegada. Além disso, há necessidade de quarentena de 10 dias em hotel. As informações são do Consulado-Geral do Brasil em Paris.

O caso de Weslley está longe de ser o único. O engenheiro civil Carlos Rafael Guimarães, de 36 anos, planeja viajar em outubro para a Espanha, mas também não consegue emitir o passaporte em espanhol. O morador de Niterói tomou a primeira dose de AstraZeneca em 14 de julho e a segunda, de Pfizer, em 13 de setembro.

“Achei até que pudesse demorar alguns dias para começar a emitir, mas uma amiga foi vacinada com duas doses de Pfizer e já conseguia emitir o dela”, conta. “Se eu não conseguir até a época da minha viagem e a companhia me deixar embarcar com a carteira de vacinação, vou ter que contar com a boa vontade do agente de fronteira de aceitá-lo em português.”

Na Espanha

Guimarães conta que abriu reclamação no aplicativo e na ouvidoria do Sistema Único de Saúde (SUS). A Espanha acabou com a quarentena obrigatória para viajantes oriundos do Brasil em 24 de agosto e adotou regras semelhantes às da França. A principal diferença é que também aceita como completamente vacinadas pessoas que tomaram a segunda dose de Coronavac há pelo menos 14 dias.

A nota técnica nº 6 do Ministério da Saúde, publicada em julho, orienta a mistura de vacinas em casos excepcionais, quando não for possível aplicar a segunda do mesmo laboratório da primeira. O documento cita como exemplo o caso de pessoas que iniciaram o ciclo de imunização em outro país e também permite que gestantes que tomaram a primeira dose de AstraZeneca antes da suspensão recebam a segunda de Pfizer ou de Coronavac.

ConecteSUS

Falhas no ConecteSUS — como ausência de dados, troca de vacinas e até suspeita de fraude — persistem e prejudicam o controle da vacinação contra a covid-19. As inconsistências continuaram em setembro, às vésperas da adoção do passaporte de vacina no Rio, suspenso pela Justiça e restabelecido pelo Supremo Tribunal federal (STF).

A segunda dose tomada pela gerente de TI Ana Paula Ribeiro, de 49 anos, levou só três dias para aparecer no sistema, mas o fato de não conseguir emitir o certificado de vacinação ameaça os planos de viajar aos Estados Unidos em novembro. É quando as fronteiras do país reabrem para pessoas totalmente vacinadas — com duas doses ou o imunizante da Janssen, aplicado em dose única — que estiveram no Brasil ou em outros 32 territórios nos 14 dias anteriores.