Movimento defende que não é preciso ser magro para ser saudável
A endocrinologista Maria Edna de Melo, presidente do Departamento de Obesidade da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia e diretora da Associação Brasileira para Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (Abeso), explica que o HAES é a origem do movimento antigordofobia. Ela considera importante o aspecto inclusivo dessa abordagem e a desconstrução de padrões de beleza, em especial para pessoas com obesidade.
“Mesmo representando mais de 20% da população brasileira, as pessoas com obesidade apanham muito, da sociedade, de profissionais de saúde e até de si mesmas”, avalia Maria Edna.
De acordo com a Associação para Diversidade de Tamanho e Saúde (ASDAH), criadora do conceito HAES, as normas sociais atuais priorizam e normalizam corpos esbeltos e magros. No entanto, não é porque uma pessoa é magra que ela é saudável. Da mesma forma que o excesso de peso não equivale a problemas de saúde.
“É você aceitar seu corpo e deixar de lado estereótipos de que só é bonito quem é magro ou tem a cintura de determinado tamanho. Cada um tem sua individualidade de composição corporal que varia muito de acordo com raça, sexo e genética. Às vezes o paciente pergunta ‘qual é o meu peso ideal?’. Eu respondo que não sei e que vamos descobrir juntos qual é o peso que faz bem para ele, que ele consegue manter e que estabiliza seus parâmetros de saúde”, completa a nutricionista Priscilla Primi.
Por isso, essa abordagem rejeita o uso de medidas como peso, índice de massa corporal (IMC) ou tamanho do corpo como fator central para a saúde. Da mesma forma que desaprova intervenções centradas exclusivamente na perda de peso, como dietas restritas e exercícios com foco no emagrecimento.
Por exemplo, um dos princípios da HAES é promover uma alimentação que equilibre as necessidades nutricionais do indivíduo e que considere aspectos como fome, saciedade, apetite e prazer. A prática de atividade física segue a mesma linha: os exercícios devem ser prazerosos e sustentáveis e não apenas ter como objetivo o emagrecimento.
Outros princípios incluem aceitar e respeitar a diversidade de tamanhos e formatos corporais; reconhecer que a saúde e bem-estar são multidimensionais e incluem aspectos emocionais, físicos, espirituais e intelectuais; e defende o respeito no acesso à saúde para todas as pessoas.
Ser saudável
Mas é possível ser saudável mesmo acima do peso? A resposta é controversa. O principal problema do excesso de peso causa uma séria de alterações que aumentam o risco de problemas de saúde. Diante disso, existe uma corrente que defende que uma pessoa com excesso de peso, sem alterações metabólicas, não precisa emagrecer, pois ela já é saudável.
Isso pode se aplicar, por exemplo, a pessoas com sobrepeso. Atualmente, o principal índice utilizado para avaliar se uma pessoa está com o peso ideal, sobrepeso ou obesidade é o IMC, que considera a relação entre a altura e o peso. Entretanto, do ponto de vista individual, outros fatores como a porcentagem de gordura e a forma como essa gordura está distribuída são ainda mais importantes que o IMC, pois são elas que vão determinar se uma pessoa pode ter um risco aumentado de doenças.
“Uma pessoa magra pode não ser saudável porque isso vai depender de sua distribuição de gordura. Se ela tiver mais gordura visceral (aquela que se acumula na barriga), ela terá um risco maior de diabetes, hipertensão e doença cardiovascular, por exemplo. Já uma pessoa que tem um IMC na faixa de sobrepeso, não necessariamente precisa emagrecer”, pontua Maria Edna.
Parâmetros bioquímicos, como exame de colesterol, triglicérides e hemoglobina glicada (exame que traça o histórico do nível de açúcar no organismo dos últimos meses) também fazem parte dessa avaliação.
“Uma pessoa acima do peso, com exames bons, sem problema de mobilidade, que faz atividade física, tem uma porcentagem de gordura e circunferência abdominal dentro da faixa ideal, não tem por que perder peso. Ela é saudável”, afirma Priscilla.
Por outro lado, quando a classificação entra na faixa de obesidade – definida por um IMC a partir de 30 –, a discussão fica mais polêmica. Estudos mostram que existem pessoas obesas que são metabolicamente saudáveis. Ou seja, que não apresentam alterações não laboratoriais associadas ao excesso de peso, e, portanto, não precisam emagrecer para ficarem saudáveis. No entanto, a maioria dos especialistas discorda com essa avaliação.
“Tem muita gente que vai fazer exames e os resultados serão normais. Só que isso não é um atestado de saúde. Tem outros estudos que mostram que muitas pessoas com obesidade são metabolicamente saudáveis, mas no longo prazo, após 10 a 20 anos, isso não se sustenta e os exames começam a se alterar”, ressalta Maria Edna.