Empresário que invadir praia vai pra cadeia
A discussão sobre o uso das praias brasileiras, que ganhou repercussão nos últimos meses após embate entre o jogador Neymar Júnior e a atriz Luana Piovani, tem um novo capítulo. A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado tem na pauta um novo projeto de lei que propõe a criminalização de invasão e ocupação de praias.
O texto do PL 2.511/2024, do senador Esperidião Amin (PPSC), propõe pena de 6 meses a 2 anos de prisão para quem restringir o acesso e circulação livre em praias, além de multa. Isso inclui: impedir ou dificultar o acesso livre à praia ou ao mar; ocupar área de praia indevidamente ou sem autorização; urbanizar indevidamente terreno adjacente à praia, dificultando o acesso livre.
Esse tipo de invasão já é proibida pela Constituição, mas atualmente não há previsão, no Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro (Lei 7.661/1988), de crime específico para quem comete a infração.
Segundo Esperidião Amin, a criação da nova lei – que inclui artigos no plano – servirá como método preventivo contra essas invasões. A proposta poderá ser votada já em regime de decisão final (sem necessidade de passar pelo plenário), provavelmente na volta aos trabalhos, em agosto. Depois, o texto, que conta com parecer favorável com apenas emenda de redação do relator Flávio Bolsonaro (PL-RJ), vai para a Câmara dos Deputados.
“O que quer dizer invadir? Dificultar, impedir, e criar dificuldade de difícil transposição, o acesso à praia”, disse Amin ao Estadão, ao ser questionado sobre o que se define que seria uma invasão ou obstrução de praia. Uma praia cujo acesso depende de aval de condomínio particular, por exemplo, se enquadra nesse cenário.
O parlamentar disse que seu projeto não deve atingir os comércios, empreendimentos ou pessoas que tiverem autorização para ocupar o espaço. Ele comparou a situação à de uma praça pública de uma cidade. “O que é dificultar o acesso à praça? É colocar mureta, fazer muro de proteção. A praça é do povo, mas isso não a impede de ter, eventualmente, uma festa de igreja, barraquinhas. Mas, para isso, é preciso ter autorização.”
O parlamentar afirmou também que a lei não vai atingir o que “é considerado benéfico para o uso comum do povo” – como “uma lixeira”, citada por Esperidião. “O espaço do guarda vidas, uma barraca de praia para vender cerveja ou um ambulante não impede acesso e uso da praia”, disse.
O senador lembrou também que prédios e restaurantes instalados na beira da praias – os chamados pés na areia – estariam dentro da legislação se estiverem autorizados e em posse da servidão. Afirmou ainda que as penas vão recair não apenas sobre quem violar a legislação, mas também sobre os órgãos que autorizariam a ilegalidade, como prefeituras e a Secretaria do Patrimônio da União (SPU). “Quem estiver obstruindo vai ter de desmontar a obstrução.”
Há relação com a PEC das Praias? Hoje a lei prevê que, embora ocupantes legais possam montar barracas ou terem a posse de imóveis em áreas litorâneas, incluindo as praias, essas áreas pertencem à União. E não podem ser fechadas, ou seja, qualquer cidadão tem o direito de acesso ao mar.
A responsabilidade de garantir o acesso às praias é dos municípios e dos órgãos ambientais. Mas, segundo o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), isso não vem ocorrendo. “O que se vê é a multiplicação de casas, prédios e empreendimentos turísticos que impedem o acesso da população brasileira a esse bem de uso comum, que é essencial ao lazer de todo brasileiro”, disse à Agência Senado.
Flávio também é relator da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 3/2022, que ficou conhecida como “PEC da privatização das praias” após a discussão entre Neymar e Luana Piovani.
O projeto da PEC 3/2022, que também está em análise na CCJ, propõe a extinção do terreno de marinha. Essas são áreas na costa brasileira, incluindo praias e o contorno de ilhas. Correspondem a uma faixa de 33 metros, medidos a partir da posição do preamar médio (maré cheia). Nessa lista, também estão as margens de grandes rios, lagos e lagoas.
Os moradores que ocupam essas áreas estão sujeitos ao regime de aforamento, sendo obrigados a pagar anualmente à União uma taxa sobre o valor do terreno. A propriedade do imóvel é compartilhada na proporção de 83% do terreno para o cidadão e 17% para a União. Sobre o porcentual federal, os ocupantes pagam as taxas de foro e laudêmio.
Se a PEC for aprovada, o proprietário de imóvel em faixa litorânea passa a ser o único dono. A mudança atingiria 521 mil propriedades cadastradas pela SPU. A medida foi criticada por ambientalistas, sob o argumento de que promoveria privatização das praias. De acordo com Flávio e outros defensores da PEC, a proposta não daria margem para privatização das áreas de praia, mas facilitaria o registro fundiário, além de gerar empregos.
Ao Estadão, Amin afirma que os dois projetos – a PEC 3/2022 e o PL 2.511/2024, de sua autoria – estão encadeados, e que propôs a inclusão da pena no Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro, motivado, na sua avaliação, por distorções feitas ao projeto relatado por Flávio Bolsonaro. “Ouvi absurdos contra a PEC dos terrenos de marinha (que passaram a ser chamadas PEC das Praias) e a acusação de que ela favoreceria ao cercamento e a privatização das praias. Isso é uma coisa estapafúrdia.”