Doença que afeta o cérebro, esquizofrenia tem tratamento. Mas ainda é preciso superar o preconceito
Nem sempre a ciência chega a criar uma vacina, um imunizante capaz de evitar que a pessoa se contamine ou que pelo menos atenue os sintomas, como os da covid. Mas é gigantesca a lista de doenças que a ciência é perfeitamente capaz de tratar.
Sempre boa aluna, Vera Gomes foi longe nos estudos: “Eu me formei em sociologia e cursei pós-graduação em turismo ambiental. Viajei o Brasil todo, fazendo trilha, explorando caverna, escalando”, conta. Ela foi servidora pública por quase 20 anos. “Era agente de cultura, organizava eventos culturais para população”, diz.
E viveu tudo isso enfrentando, tratando e aprendendo a lidar com a esquizofrenia, diagnosticada na juventude. “O tratamento te dá controle, te dá estabilidade mental. Você pode trabalhar, você pode estudar, você pode viajar, você pode casar, você pode sair com os amigos, você pode ter um hobby, você pode fazer o que você quiser”, acrescenta Vera, hoje palestrante e produtora de conteúdo sobre saúde mental.
“Esquizofrenia é uma doença que afeta o cérebro. É como se fosse um curto-circuito que faz com que o cérebro não funcione de forma adequada e a pessoa passa a ter comportamentos que demonstram que ela não está conectada à realidade assim como nós estamos. Isso se manifesta através de sintomas como delírios, que é achar que está sendo perseguido – não tem porque ela ter essa crença – e alucinações, que é ver e ouvir coisas que não estão presentes”, explica o psiquiatra Ary Gadelha, coordenador do ambulatório de esquizofrenia da Unifesp.
Os sintomas podem ir de leves a graves a ponto de prejudicar muito a vida dos doentes e suas famílias, mas se diagnosticada e tratada logo de forma correta, com medicamentos e terapias, muitos doentes conseguem ter uma vida ativa e plena. Para isso é preciso superar também uma grande barreira: a do estigma, do preconceito.
Barreiras que muitos, mesmo sem querer ou perceber, ajudam a levantar negando oportunidades ou usando de forma negativa ou pejorativa palavras que reforçam o estigma.
“O termo que a gente mais combate é o uso da palavra esquizofrênico, porque quando a gente usa essa palavra para definir alguém que tem a doença, é como se a gente resumisse aquela pessoa à condição que ela tem. Elas podem coisas maravilhosas. Nós temos pessoas que têm esquizofrenia que ganharam o Prêmio Nobel, são artistas”, diz Ary Gadelha.
Aprender com a diferença
Foi depois do primeiro surto do filho, aos 19 anos, que Sarah Nicolleli criou a Associação Mãos de Mães de Pessoas com Esquizofrenia, que dá todo tipo de apoio a pacientes e suas famílias e trabalha pela inclusão.
“A gente tem que entender e a sociedade tem que entender que a gente aprende com as diferenças. O fato de eu não ter uma deficiência física, mental não me faz melhor ou pior. Meu filho me deu um neto maravilhoso. Atualmente, ele faz faculdade de economia, dentro do prazo dele, dentro do tempo dele, sem cobranças minhas”, afirma.
Graças aos avanços da medicina, à evolução ainda que lenta da sociedade e ao apoio de pessoas como Sarah e Vera, que militam pelos pacientes nas redes sociais, que jovens como Rick podem superar as dificuldades da esquizofrenia.
Lutador de judô, universitário e educador físico, ele se encheu de coragem para falar de sua condição e da importância do amor, da informação e da solidariedade.
“Dez anos sem nada, fazendo um tratamento psicológico e psiquiátrico. E a família, até dá vontade de chorar, minha família ajudou demais, foi a base. É muito importante ter apoio de quem está do seu lado. Muita gente não sabe ainda da patologia. Eu encarei. Falei: ‘Vou encarar’. Porque eu posso abrir os olhos de outras pessoas, ajudar. Eu acho que vai ser legal essa matéria”, diz Henrique Silveira Ferreira de Medeiros, universitário e educador físico.